TEXTO: RM. 1.17
TEMA: COMO POSSO ENCONTRAR UM DEUS MISERICORDIOSO?
No
dia de hoje lembramos a Reforma realizada pelo Dr. Martinho Lutero, iniciada no
dia 31 de outubro de 1517 quando afixou as 95 teses na porta da Igreja de
Wittenberg, na Alemanha. Tantos anos se passaram, e ainda guardamos na memória os
grandes acontecimentos que marcaram a História, que movimentou o mundo
religioso, cultural, político e econômico da época. Mas será que as pessoas sabem
quem foi Lutero? Será que os luteranos conhecem o legado que Lutero deixou?
Conhecem as suas obras? Para
muitas pessoas, Lutero continua sendo um desconhecido ou, no máximo um monge
rebelde que protestou contra a Igreja e que abandonou o convento, porque queria
casar. Outros afirmam que Lutero foi um antissemita,
perseguiu os judeus. Afirmam ainda que, ao mesmo tempo em que
Lutero apresentava sólida argumentação teológica, exegética e histórica, também
se utilizava de frases, figuras e exemplos do cotidiano, muitos dos quais eram preconceituosos
e agressivos contra os acusadores. E por fim, tem aqueles que afirmam que os seus vícios, às vezes, eram
mais visíveis do que as virtudes.
No entanto, para outros, ele deixa de ser um
desconhecido, pois ocupa espaço nos estudos de
muitos acadêmicos e graduados de diversas áreas do conhecimento humano, ou
seja, da teologia, da política, da economia e da cultura. Além disso, as obras
de Lutero têm despertado interesse. São obras que têm fascinado estudiosos. Na
qualidade de teólogo, pregador, conselheiro espiritual, poeta de hinos e
orador, Lutero deu testemunho da mensagem bíblica a respeito da salvação em
Cristo Jesus, levando às pessoas através das suas mensagens, o consolo e o
cuidado aos necessitados. É de se admirar a coragem que ele teve de manifestar
seus sentimentos, de forma tão obstinada numa época de terror em que a
inquisição perseguia, e condenava pessoas à morte de forma arbitrária e
impiedosa.
Indiscutivelmente, a Reforma está entre os acontecimentos incisivos na
História alemã, europeia e mundial. Por isso, há bons motivos para recordar a
Reforma por ocasião dos 505 anos do aniversário da “divulgação das teses”, pois
ela foi importante revolução cultural e histórico-religiosa. Ela influenciou
tanto a língua alemã, como teve efeitos também sobre a música e a arte. Deu
impulsos importantes ao setor educacional e criou as bases para a participação
social e política. Como se observa, Lutero desempenhou um papel de tremenda
importância na transformação da igreja e da sociedade medieval, que teve
efeitos duradouros, e que ainda se mostram na atualidade.
Entretanto, não vamos nos deter no legado que Lutero deixou para
humanidade, uma vez que as suas obras são extensas. Mas vamos refletir sobre a
situação espiritual que vivia o povo naquela época. A Idade Média se
caracterizou por um profundo desprezo à fiel pregação da Palavra de Deus por
parte dos clérigos da igreja romana. As pessoas acreditavam em bruxarias, eram
cheias de superstições e só ouviam falar de Jesus como Juiz irado e não como o
amoroso Salvador. Além disso, o que mais perturbava o povo na época, era a
venda das indulgências. Por outro lado, as obras desempenhavam o papel
principal no ensinamento dos mestres e professores daquela época. O
relacionamento entre homem e Deus, era através das boas obras. Diante deste
ensinamento, Lutero vivia preocupado: “Como posso encontrar misericordioso?”
I
Lutero foi um jovem educado
nas verdades cristãs. Ele conhecia sobre Deus, pois a igreja o lembrava,
constantemente, sobre a existência do Deus Criador, mantenedor e justo. Ele
conhecia os mandamentos de Deus. Os dez mandamentos lhe foram incutidos no lar,
na escola e na igreja. Ele conhecia Jesus, o Filho de Deus, Salvador. No
entanto, todas estas verdades foram lhe ensinadas com um enfoque na lei de
Deus. Na verdade, foi educado sob o rigor baseado na lei de Deus. Na medida em
que crescia e meditava na lei, crescia também o pavor diante do Santo e justo
Deus. A lei despertou no coração de Lutero a pergunta: “Como conseguirei um
Deus misericordioso?”
Esta era a pergunta vital que atormentava Lutero. A pergunta que pairava
na mente de todas as pessoas da época. É a pergunta da humanidade ainda nos
dias de hoje. O homem de hoje também pergunta, uma vez que a nossa geração não
está longe dos costumes, crenças e preocupações que havia no tempo de Lutero. A
maioria das igrejas tem pregado sobre prosperidade no lugar de arrependimento. Têm
pregado curas e milagres em lugar de novo nascimento. Têm pregado psicologia de
autoajuda, em lugar de ajuda do alto. Têm pregado um antropocentrismo
idolátrico, em vez de pregar a soberania de Deus, a centralidade de Cristo e o
poder do Espírito Santo. Muitos pregadores inescrupulosos, em busca de
resultados imediatos ou até mesmo de lucro, mudam a mensagem, e acrescentam
práticas místicas como água ungida sobre o rádio, rosa ungida, cair no espírito
e coisas semelhantes, levando o povo a colocar sua confiança em amuletos e
coisas de nenhum valor aos olhos de Deus. Alguns segmentos da igreja
contemporânea perdeu o foco quando abraçou o liberalismo teológico de um lado e
o misticismo por outro
Como conseguirei um Deus misericordioso? Quando Lutero interrogava e
queria resposta, a igreja tentava sufocar tal pergunta ou respondia
levianamente: cumpre a lei e as ordens da igreja. Mas se você quer ter plena
certeza do perdão, torne-se monge. Lutero tentou o caminho das obras ensinadas
pela igreja. Certo dia, ao regressar da casa de seu pai, foi surpreendido por
uma tempestade. Refugiou-se numa floresta. De repente, bem perto dele, um raio
atingiu uma árvore, que se partiu ao meio. Lutero, apavorado, temendo a morte e
o juízo de Deus, exclamou: “Santa Ana, valei-me! Far-me-ei monge, se me for
poupada a vida.” De volta a Erfurt, tratou de cumprir sua promessa. E contra a
vontade de seus pais, professores e muitos amigos, entrou no mosteiro. E
naquele lugar, pensava em buscar a perfeição. Estudou e orou muito. Mendigou.
Flagelou-se até desmaiar. Tornou-se sacerdote.
Entretanto, a paz da alma parecia-lhe cada vez mais distante. Lutero
confessou: “Por mais que me dedicasse e buscasse a Deus, eu não podia amar a
este Deus que exige, ameaça e condena. Eu odiava a Deus.” Mesmo em todo a esse
desespero, Lutero continuava lendo a Bíblia. Foi na Bíblia que Lutero descobriu
o evangelho obscurecido desde a época dos discípulos. Ele ficou extremamente
emocionado com essa descoberta: “Finalmente, pela misericórdia de Deus,
meditando de dia e de noite, dei atenção ao contexto das palavras, a
saber: 'O justo viverá pela fé.' Então comecei a entender que a justiça
de Deus é aquela pela qual o justo vive por um dom de Deus, em outras palavras,
pela fé. Aí toda a escritura me mostrou uma face totalmente diferente. (...)
Assim como antes eu havia odiado violentamente a frase “justiça de Deus”, com
igual intensidade de amor eu agora a estimava como a mais querida. Assim esta
passagem de Paulo de fato foi para mim a porta do paraíso.”
II
Quando Lutero viu que o homem é salvo pela graça de Deus, revoltou-se
contra os abusos da Igreja e escreveu as 95 teses. Foram afixadas no dia 31 de
outubro de 1517, na porta da capela da cidade de Wittenberg na Alemanha. As quais
versavam principalmente sobre penitência, indulgências e a salvação pela fé.
Martinho Lutero provocou mudanças profundas ao denunciar esta situação. Sendo
assim, esta verdade, que Lutero descobriu, precisava ser anunciada. Precisava ser proclamado que “o justo viverá
pela fé” e não pelas suas riquezas, ou por posição social, e nem pelas boas
obras. De fato, esta notícia se espalhou rapidamente pelo mundo católico
europeu. Em apenas duas semanas, as teses foram traduzidas para o alemão e
amplamente copiadas e impressas. De tal forma que, se espalhou por toda a
região da Alemanha e, nos próximos dois meses, conquistou toda a Europa.
Começava ali uma luta, o empenho firme e decidido baseado em três grandes
pilares: Sola Gratia, Sola Fide e Sola Scriptura. Este assunto foi o centro da
Reforma e seu mais precioso legado à cristandade.
Lutero encontrou esta verdade do evangelho autêntico em Romanos 1, versos
16 e 17: “Porque não me envergonho do evangelho de Cristo, pois é o poder
de Deus para salvação de todo aquele que crê; primeiro do judeu, e também
do grego. Porque nele se descobre a justiça de Deus de fé em fé,
como está escrito: Mas o justo viverá da fé” (Rm 1.16 -17). Ele encontrou
ainda a certeza de que não há como alguém merecer o favor de Deus por causa de
alguma coisa que faz. Mas a única forma de alguém obter o favor Deus é através
da fé em Jesus Cristo; que é através da fé em Jesus que os pecados são
perdoados por Deus. Este entendimento, conhecido como a doutrina da
justificação pela fé, tornou-se um dos pilares do pensamento religioso de
Lutero. Até ao fim da sua existência, Lutero quer como monge como professor,
quer como pastor, sempre considerou a Sagrada Escritura como a fonte autêntica
da verdade para todos os aspectos da vida do homem e da sociedade
Assim como Deus agiu na História, através de Lutero, ocasionando a
Reforma, Deus também quer usar a cada um de nós, para transmitir a sua mensagem
ao mundo e mostrar ao nosso próximo que o “justo vive pela fé”. Também é um
momento para agradecermos porque temos a Palavra de Deus e as Confissões
Luteranas que expõem a Escritura com clareza, cujo resumo conhecemos no
Catecismo Menor. Nossa liturgia e nossos hinos nos transmitem o doce evangelho,
bem como assim nossos devocionais. Nosso pedido e nossa súplica é que Deus, por
sua misericórdia nos conserve firmes e fiéis às Sagradas Escrituras. Nesse
mundo de tantas tentações, de tantas adequações e tantas acomodações, que Ele
jamais permita que o liberalismo, costumes, praxes, tradições e ou adaptações
deste mundo, se sobreponham a verdade única e absoluta da Bíblia Sagrada. Hoje
louvamos a Deus, porque depois de 505 anos, ainda continuamos pregando,
confessando e proclamando que o “Justo viverá por fé.”
Portanto, pedimos a Deus que nos faça crescer no consolo da graça, nos mantenha
firme na fé, no amor à sua palavra e nos capacite para nossa missão. Na missão
de anunciar que o “justo viverá pela fé”. Amém!