TEXTO: MT. 18.21-35
TEMA: SAIBAMOS PERDOR NOSSO IRMÃO
No contexto anterior da parábola, Jesus havia ensinado sobre como tratar os irmãos que pecam contra nós, ou seja, o tratamento que deve ser dispensado a um irmão culpado (18.15-20).O objetivo era conscientizar os discípulos sobre o dever de perdoar os irmãos com amor e misericórdia, buscando a reconciliação e o perdão. Diante disso, o apóstolo Pedro perguntou a Jesus sobre quantas vezes se deve perdoar a um irmão culpado. Foi nesse ponto que Jesus introduziu a Parábola do Credor Incompassivo. Portanto é um parábola que revela a importância da misericórdia e do perdão.
Baseado neste assunto, o seguinte tema serve como base da nossa meditação: “Saibamos perdoar nosso irmão.” E como estrutura deste tema, vamos refletir sobre dois pontos: primeiro, porque Deus perdoou a nossa dívida, quando enviou seu Filho que morreu na cruz por nós. Ele não apenas perdoou, mas também oferece o perdão a todos nós, independentemente, de nossas transgressões. Seu exemplo nos ensina que não importa o quão grande sejam nossos erros, seu amor é maior e seu perdão está sempre disponível para aqueles que buscam verdadeiramente. Segundo, porque movido pelo amor que Deus demonstrou através de Cristo na cruz, um perdão pleno, gratuito e eterno, oferecido a todos quantos se arrependerem e creem no evangelho, os cristãos devem perdoar o seu irmão. Não deve retribuir, pagando em dobro a ofensa. Ele deve perdoar não sete vezes, nem uma única vez, mas sempre.
I
Em conformidade com o ensinamento de Jesus sobre a disciplina na igreja, Pedro aproximou-se de Jesus e perguntou: “Senhor, até quantas vezes meu irmão pecará contra mim, que eu lhe perdoe? Até sete vezes?” (v.21). Podemos observar, claramente, que existia uma dúvida no coração de Pedro em relação ao perdão para com o próximo. No seu entender o perdão era condicional, ou seja, pensava que devia colocar condições para perdoar. Esta dúvida de Pedro surge no seguimento do que Jesus tinha dito anteriormente. Ele ouviu sobre a ovelha reencontrada e sobre a necessidade de os irmãos se reconciliarem. Diante de todos estes assuntos ,ficou em dúvida e perguntou a Jesus: Senhor, quantas vezes devo perdoar a meu irmão, se ele continuar me ofendendo? Devo perdoar sete vezes? Devo dar sete oportunidades?
Jesus, então, responde: "Não te digo que perdoes até sete vezes, mas até setenta vezes sete”. (v.22) Jesus fez uma conta interessante ao usar o número sete como símbolo da perfeição. Esse número aparece 300 vezes nas Escrituras. O maior número de ocorrências são registradas em Apocalipse. Mas qual o significado que Jesus queria transmitir a Pedro? Vamos analisar o contexto histórica da questão. Os rabinos tinham uma concepção de que se uma pessoa pecasse contra alguém uma vez, deveria perdoar. Se ela pecasse duas vezes, também deveria perdoar . Se ela pecasse três vezes, ainda assim deveria perdoar. Se ela pecasse quatro vezes, retribua-lhe na mesma moeda. Eles achavam suficiente perdoar uma pessoa três vezes. Depois disso, a justiça exigia retribuição. Ora, Pedro, não diz três, ele vai mais longe: ele pergunta se são sete vezes suficientes para podermos julgar o nosso irmão. Pedro pensava que perdoar a um irmão sete vezes era ficar muito próximo da perfeição divina, pois o sete era o número da perfeição. Seria o numero perfeito de vezes a perdoar alguém. Na verdade, ele levou o perdão muito além da limitada ideia dos fariseus. Para o apóstolo Pedro, sete, era mais que o dobro das vezes que os rabinos estavam dispostos a perdoar.
Jesus adiciona uma multiplicação ao número sete para demonstrar a Pedro que precisaria ir muito mais além no exercício do perdão. Ele não estabelece um limite para perdoar. A expressão setenta vezes sete proferida por Jesus significa tantas vezes quantas forem necessárias. Quem perdoa de fato não conta. O que devemos fazer é perdoar e esquecer sem guardar qualquer ressentimento e sem qualquer tentativa de vingança contra nossos ofensores. Pedro precisava entender esta verdade vital: o perdão não é medido pelo número de vezes que alguém nos ofende. Jesus. em outras palavras. estava tentando mostrar a ele que o perdão deve ser incondicional e infinito. Ao ouvir aquelas palavras, ministradas por Jesus, sentiu a importância da necessidade de se perdoar e pedir perdão.
Para melhor esclarecimento a respeito do perdão, Jesus conta uma parábola que certamente iria de uma vez por todas, esclarecer as possíveis dúvidas existentes em seu coração. Jesus fala que o reino dos céus pode ser comparado a um rei que possuía muita terra, e alguns administradores com a tarefa de cuidar de seus bens. Um destes administradores ficou muito endividado com o rei. Ele resolveu “acertar contas” com o servo. No entanto, o servo não tinha as mínimas condições para prestar contas. Sua dívida é de “dez mil talentos”. Talento era uma unidade de peso usado para designar grandes quantidades de ouro ou prata. O talento usado nos tempos do Novo Testamento pesava 58,9 kg. Este servo devia 10 mil talentos, era um débito impossível de ser pago, o que exigia um perdão do rei.
O rei muito severo ordenou que o devedor e sua família fossem vendidos para pagar a dívida. Assim diz o texto: “Não tendo ele, porém com que pagar”, (v.25) o rei exigiu o pagamento de acordo com as circunstâncias do indivíduo. Por isso, deveria vender a sua família, como escravos para pagamento das divididas. (Amós 2.6; 8.6 e Neemias 5.4,5.). Mas o servo, “prostrando-se reverente, rogou: “Sê paciente comigo e tudo te pagarei”. (v.26). A expressão “sê paciente” apresenta a ideia de um pedido de prazo referente a sua dívida. Às vezes, o vocábulo também significa simplesmente uma paciência prolongada, longanimidade.
Depois de ouvir as súplicas por misericórdia, o rei, movido de íntima compaixão pelo devedor, decide libera-lo em paz, perdoando toda a dívida:” O senhor daquele servo compadecendo-se, mandou-o embora e perdoou-lhe a divida”.(v.27).O verbo σπλαγχνίζομαι no grego significa ser movido pelas entranhas, pois se achava que as entranhas eram considerados como sede das emoções. Neste sentido as pessoas eram movidas pela compaixão e misericórdia. Já o verbo ἀφίημι ,traduzido como perdoar. traz um conotação judicial, que tem o sentido de: soltar, libertar, fazer alguém livre. O termo δάνειον significa literalmente "empréstimo". Isto significa que aquele senhor teve misericórdia e perdoo seu empréstimo. Este empréstimo foi imensamente acrescido de juros, os quais eram enormes em muitas culturas do oriente. que era impagável. Fato do empréstimo não poder ser pago foi o fator que levou o rei a usar de misericórdia e perdoar. Foi beneficiado através do perdão dado pelo rei: ele e a sua família ficaram livres de ser vendidos como escravos. O rei não se ressentiu pelo prejuízo assumido, nem ameaçou vingança em ocasião oportuna.
A nossa dívida espiritual também era enorme e altíssima. Ela atingia a casa dos dez mil talentos, ou seja, é incalculável. Nossa dívida foi tão grande que não podíamos pagá-la, mesmo que tivéssemos que usar todos os nossos recursos, poderes e obras, nós não teríamos condições para pagar a nossa divida. Somente pela graça de Deus, através de seu Filho Jesus, que conquistou na cruz, é que recebemos o perdão de todas as nossas faltas, dívidas, transgressões e pecados. Sendo assim, o sacrifício de Cristo não apenas nos garantiu o perdão de Deus, mas Ele continua nos perdoado. Portanto, peça perdão, arrependa-se perante ao único que pode apagar os seus pecados. A Bíblia nos orienta a confessarmos o nosso erro a Deus: “Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça.” (1 João 1.9)
II
O servo saiu da presença do rei e foi ter com um de seu conservo que lhe devia um pouco, apenas cem dentários. Dentário era um sistema monetário que circulava durante o Império Romano. Era o valor que recebia um trabalhador por um dia de trabalho na época, no tempo de Jesus (Mateus 20.2,13). Na taxa de câmbio daquele tempo seriam necessários 6.000 dentários para igualar a apenas um talento. O homem levaria 19 a 20 anos para ganhar somente um talento. Simplesmente não havia meio para que essa dívida jamais fosse paga.
É difícil de entender esta situação: um servo que fora perdoado, se recusou a perdoar um dos seus conservos. Ele tratou o seu conservo sem qualquer respeito e amor, como se não fosse pessoa digna de consideração. Assim expressa o texto: “Agarrando-o, o sufocava”. (v.28). O verbo está no imperfeito e indica uma ação contínua, ou seja, o homem persistia em maltratar o outro miseravelmente até que pagasse o divida. Mas, ele caindo-lhe ao pés, implorava: “ Sê paciente comigo, e te pagarei.” (v.29). O tempo imperfeito no grego, traduzido como implorava, indica também uma ação contínua, ou seja, o conservo continuava a implorar diligentemente, mas em vão. Implorava, demonstrava a mesma atitude de humildade, usava as mesmas palavras, tinha a mesma necessidade de misericórdia, e certamente não tinha menor direito ao perdão. Assim diz o texto: “Ele, entretanto, não quis; antes, indo-se, o lançou na prisão, até que saldasse a dívida.”(v.30) Recusou de forma persistente a respeito dos pedidos do conservo. Chegou ao extremo de lançar o conservo na prisão. A sua atitude demonstra que esquecera totalmente do perdão recebido.
O rei ficou sabendo deste acontecimento, através dos amigos do conservo, que narram a história de forma intensiva. Ao saber desta história mandou chamá-lo e lhe disse: “Servo malvado, perdoei-te aquela dívida toda porque me suplicaste; não devias tu, igualmente, compadecer-te do teu conservo, como também eu me compadeci de ti?" (v.32 e 33). “Servo malvado”. Esta é a forma como expressa o rei ao servo ingrato. Ele se tornou um servo maldoso, egoísta e imoral, não soube compreender o perdão, não soube expressar a sua gratidão. A sua atitude de colocar o conservo no cárcere foi um ato de ingratidão. Sendo assim, a primeira atitude do rei foi anular tudo que tinha feito em favor do servo, ou seja, invalidou o perdão que havia concedido. Agora, só lhe restou o castigo. O rei ficou indignado com a atitude do servo. Ele desabafou a sua indignação. Desta vez o servo não tinha esperança. Diante de sua atitude foi entregue aos verdugos: “E, indignado, o seu senhor o entregou aos verdugos, até que pagasse tudo o que lhe devia”.(v.34).Os verdugos eram indivíduos responsáveis por aplicar penas corporais e psicológicas com a finalidade de afligir o torturado e fazer-lhe sofrer pelo crime que cometeu.
As nossas atitudes não são diferentes. Todos nós nos encontramos na situação daquele homem. Temos recebido compaixão de Deus e o seu perdão, através de Cristo. E quais são as nossas atitudes? Queremos receber o perdão quando erramos, mas nem sempre oferecemos o perdão quando requerido de nós. Observa-se que muitas pessoas têm dificuldade em perdoar, guardando mágoa, ressentimento, raiva, por semanas, meses, anos e alguns pela vida toda. Lembrando que o homem que se recusa a perdoar, a ter compaixão para com seus semelhantes, mostra uma ingratidão. Está desconsiderando o perdão de Deus. Quem assim procede, Deus retira seu perdão do qual necessitamos para alcançar a vida eterna. Cristo nos exorta severamente, sob pena de perdermos a graça de Deus. Isto Jesus expressa nas palavras: “Assim também meu Pai celeste vos fará se do íntimo não perdoardes cada um a seu irmão. (v. 35). Cristo ainda afirma: “Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celeste vos perdoará; se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas, tampouco vosso Pai vos perdoará as vossas ofensas.” (Mateus 6.14 e15).
Portanto, movido pelo amor que Deus demonstrou através de Cristo na cruz, um perdão pleno, gratuito e eterno, um exemplo de sua infinita graça e amor por nós, oferecido a todos quantos se arrependerem e creem no evangelho, os cristãos devem perdoar o seu irmão. Não devem retribuir, pagando em dobro a ofensa. Não devem perdoar sete vezes, nem uma única vez, mas sempre. O exemplo de Jesus nos mostra que o perdão não é uma tarefa fácil, mas é possível quando permitimos que o amor e a compaixão guiem nossos corações. Ele nos ensina a olhar além dos erros e falhas dos outros, e ver a humanidade em sua essência com todas as suas imperfeições. Enfim, Ele nos convida a estender a mão da misericórdia e do perdão, mesmo quando somos feridos. Seu exemplo nos ensina que não importa o quão grande sejam nossos erros, seu amor é maior e seu perdão está sempre disponível para aqueles que buscam verdadeiramente. “Antes sede bondosos uns para com os outros, compassivos, perdoando-vos uns aos outros, como também Deus vos perdoou em Cristo.” (Efésios 4.32).
Se de nossa parte não queremos perdoar ao nosso irmão, como poderemos esperar o perdão de Deus? Que nós saibamos perdoar o nosso irmão diariamente em nossa vida, assim como Cristo nos perdoa. Amém.
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